ILHA DO REI JORGE

ANTÁRTICA – ILHA REI JORGE – 1992-93



Nesta sua segunda expedição à Antártica, Thomaz teve o privilégio de participar da 1ª. Expedição glaciológica brasileira, na ilha Rei Jorge, no verão polar, como alpinista de apoio ao glaciólogo Jefferson Cardia Simões, da UFRGS, que comandava o projeto “Balanço de Massa, Morfologia, Dinâmica e Glacioquímica da Cobertura de Gelo da Ilha Rei Jorge”.

A equipe ficou hospedada na Estação Comandante Ferraz, na Península Keller, dentro da Baía do Almirantado. O trabalho começou em duas geleiras próximas à base, Flagstaff e Noble. Ali, utilizando técnicas e equipamentos de escalada para se deslocarem, e com auxílio de uma sonda manual, fincaram várias estacas de alumínio, com 4 metros cada, na superfície de gelo. As estacas foram enterradas somente até a metade e tiveram a posição de suas coordenadas calculadas com absoluta precisão. No ano seguinte, Jefferson e sua equipe iriam medir o quanto as estacas afundaram na neve e se deslocaram para frente.

O desafio seguinte seria muito mais perigoso e desafiador. O objetivo do Prof. Jefferson era escalar até um ponto próximo ao topo da calota polar da ilha (686 metros de altitude) e coletar amostras de gelo a até 10 metros de profundidade. A essa altura, devido à dificuldades técnicas da empreitada, o outro alpinista da base, Alexandre Cymbalista, se integrou ao time.

A primeira tentativa foi acessar a calota pela própria Península Keller, mas o caminho, embora curto, logo se mostrou impossível, devido ao excesso de fendas no gelo, que se cruzavam entre si... Assim, atravessaram de barco para o outro lado da Enseada Martel, oposto à base, para tentar achar outro acesso à calota. Encontram um caminho pela linda e extensa Geleira Krakow.

Na segunda tentativa, conseguiram chegar no topo da geleira. Depois de percorrerem alguns quilômetros, descobriram que por ali, o acesso, também muito fragmentado, ao topo da calota de gelo da ilha seria muito demorado e perigoso. Se entrasse neblina durante a subida, corriam o risco de ter que passar dias lá em cima.




Com a vinda do navio para levá-los de volta ao Chile nos próximos dias, decidiram tentar novamente pela Península Keller. Numa mistura de ousadia e prudência, contornaram ou passaram por cima de um intrincado sistema de fendas gigantes, até encontrarem um caminho viável, devidamente marcado com varetas de bambu. Seria por ali o caminho!

Precisando de velocidade, dias depois, apesar do persistente mal tempo e visibilidade quase zero, os três homens reduziram drasticamente sua carga, eliminando quase toda comida e equipamentos de camping. Para avançar geleira acima, usaram um pequeno trenó apenas com a sonda e seus acessórios. Navegando apenas com auxílio de bússola em meio ao frio e à densa neblina, passaram a noite subindo.

No lugar escolhido pelo Prof. Jefferson, cavaram uma trincheira no gelo com 2 metros de profundidade, em cujas laterais o professor, coletou suas amostras. Depois, com a sonda manual trazendo testemunhos de gelo em seu interior, perfuraram mais 8 metros da superfície gelada do fundo do buraco e atingiram os 10 metros desejados pelo pesquisador.

Passaram a noite toda trabalhando, sob a luz tênue do sol da meia noite escondido atrás das nuvens. Ao amanhecer, com o trabalho concluído, mesmo exaustos e famintos, contornaram novamente o sistema de fendas e desescalaram de volta à praia. Dali, voltaram à base. O navio chegou dois dias depois.

O relato dessa jornada está no livro UM OUTRO MUNDO LÁ FORA – Expedições ao Ártico, Antartica, Alasca e Himalaia.

(Antiga) Base Antártica Comandante Ferraz, sob o Morro da Cruz

(Antiga) Base Antártica Comandante Ferraz, vista do Morro da Cruz, e a Enseada Martel

(Antiga) Base Antártica Comandante Ferraz, vista da Geleira Flagstaff


Vista das curvas da Aresta Tyrrel, que divide a Península Keller, vista do topo da Geleira Noble. À esquerda, no horizonte, a entrada da Baía do Almirantado, que se bifurca em duas enseadas, Martel (esq na foto) e Mackellar. Na base da Península, na praia à esquerda, aparece a base Comandante Ferraz.

Barco de apoio à base. Ao fundo, o navio polar (já aposentado) brasileiro Prof. Barão de Teffé

(Antiga) Base Antártica Comandante Ferraz


Voltando para a Estação Ferraz, via Praia da Baleia, batizada em homenagem ao esqueleto montado por Jacques Cousteau com os ossos encontrados na praia. À direita, o que sobrou a Estação inglesa G, que operou de 1947 a 1961.

Alex (na frente, ao lado de uma das estacas que enfiamos no gelo) e o Prof. Jefferson Simões, no topo da Geleira Noble.

Leão marinho próx. a Base Arctowsky (polonesa).


Pinguins próx. a Base Arctowsky (polonesa)

Explorando a borda da geleira Krakow, que subiríamos dias depois

Alex (na frente) e o Prof. Jefferson no topo a Geleira Krakow, por volta das 22h00.

Prof. Jefferson observando o intrincado sistema de fendas gigantes no gelo, no topo da geleira Domeyko. Foi essa visão que nos fez desistir de subir por ali para o topo da calota polar da ilha. Dias depois, sem outras alternativas, foi exatamente por ali, sob forte neblina, que subimos.

Alex, puxando o trenó com a sonda, e o Prof. Jefferson, sob forte neblina, rumo ao topo da calota polar da ilha Rei Jorge.

Prof. Jefferson rosqueando a sonda, no fundo da trincheira aberta por nós, quase no topo da calota polar da ilha Rei Jorge.